Coexistência entre alemães e ingleses nos Açores em romance de Joel Neto
2018-05-22 14:30:40 | Lusa
Durante a Segunda Guerra Mundial, nos Açores acontecia o impensável: ingleses e alemães viviam em paz e conviviam entre si, cenário que serve de pano de fundo ao novo romance do escritor Joel Neto, denominado "Meridiano 28".
O romancista, natural de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, foi sugestionado por António Bulcão, escritor e músico açoriano, para escrever sobre esta realidade na ilha do Faial, na década de 1940, conhecida como o “maravilhoso tempo dos cabos submarinos”.
A cidade da Horta era então tocada, como viria o escritor a aperceber-se nas suas pesquisas, pelos hidroaviões ‘clippers’ (Boeing 314) da PAN America, que foram os primeiros aviões a realizar a travessia do Atlântico Norte com voos comerciais que transportavam a bordo magnatas, milionários, estrelas de cinema e figuras conhecidas do boxe e da política mundial.
“De repente, naquele período magnífico, temos a fama, a par da guerra, que pode destruir toda uma civilização e, simultaneamente, famílias de diferentes nacionalidades inimigas a viver não só em paz mas em tranquilidade, e mesmo em folia, até 1943, altura em que Salazar fez inclinar para o lado aliado a posição de Portugal”, alude o romancista.
Ingleses e alemães jogavam ténis e críquete, dançando ao som do jazz, realizando mesmo piqueniques “enquanto as suas famílias remotas estavam a matar-se no outro lado da Europa”.
Joel Neto achou este cenário “absolutamente formidável” e deixou-se seduzir pelo 'glamour' da época, ficando reunidas as condições para escrever o romance, que beneficia também do facto de aquela época estar “bem documentada” em opúsculos e autobiografias, a par de outros registos.
"Meridiano 28" não se passa apenas na década de 1940 da ilha do Faial, percorrendo 100 anos de história desde a Primeira Guerra Mundial até à contemporaneidade, passando por Lisboa, Praga, Friburgo, Nova Iorque e Porto Alegre e outras ilhas dos Açores, desenrolando-se a “grande história de amor” no vale das Furnas, em São Miguel.
Pretendendo que este seja ”um romance do mundo com os Açores no coração", Joel Neto considera que um escritor pode escrever “em qualquer sítio do mundo e os seus livros não serem melhores ou piores por se estar nesta ou naquela geografia", a não ser que "esta exerça um papel catalisador que propicie a melhoria das suas obras”.
O escritor, que reside atualmente na ilha Terceira, está perto do que o comove, das paisagens da sua infância, escrevendo sobretudo sobre a memória, o que o coloca na “linha da frente” da sua matéria literária.
Embora admita que “um dia isso possa ser mau”, os seus romances “são muito melhores hoje em dia e o percurso mais coerente, consolidado e profissional" do que quando vivia em Lisboa”.
Não há para Joel Neto uma receita para a literatura, uma vez que cada escritor “é ele próprio uma receita, muitas receitas, porque cada livro é algo novo”.
O livro é lançado hoje, na FNAC, em Lisboa, sendo apresentado pelo escritor João de Melo.
Joel Neto é autor de quatro romances, uma coleção de contos e vários volumes de crónica e diário, sendo cronista permanente de vários jornais, entre eles o Diário de Notícias.